QUEM SÃO AS PESSOAS QUE DEUS “DE ANTEMÃO CONHECEU”?
Em Romanos 8.28-30, o apóstolo dos gentios diz:
Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito. Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou.
Nessa passagem, Paulo vai da eternidade passada à eternidade futura a partir do presente.[1] Tudo presentemente coopera para o bem daqueles que presentemente amam a Deus. A partir dessa afirmação, a mente de Paulo – inspirada pelo Espírito – recua à eternidade pretérita: “Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem do seu Filho” (v. 29). Quem são estes que Deus “de antemão conheceu”? Evidentemente, a resposta se encontra no contexto imediato. O versículo 29 começa com o pronome relativo οὓς (hoús – “aos que”) após a conjunção ὅτι (hóti – “porquanto”). É de se esperar que o pronome relativo retome um termo anteriormente mencionado. O antecedente para este pronome está no versículo anterior: “aqueles que amam a Deus” (v. 28). Isso é reforçado pela conjunção causativa hóti (v. 29) que liga a afirmação ao versículo anterior.[2]
Desta forma, Paulo apresenta seu raciocínio: Deus conhecendo desde a eternidade que eles o amariam, os predestinou para a glória eterna, quando, enfim, serão plenamente restaurados à imagem do Seu Filho. Assim, ele apresenta o plano divino até a consumação do seu propósito na eternidade futura: “E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou” (v. 30).
Norman Geilser diz acerca dessa passagem: “As mesmas pessoas que são predestinadas são chamadas, justificadas e finalmente glorificadas (vão para o céu). A fim de evitar a segurança eterna, a palavra ‘alguns’ teria de ser inserida no texto, mas ela não está lá. Todos que são justificados serão glorificados no fim”.[3]
Alguns insistem que, embora todos os eleitos serão finalmente salvos, nem todos os salvos são, de fato, eleitos, podendo assim perder sua salvação no meio do caminho.[4] Isso contradiz o texto em tela. A distinção entre “eleitos” e “salvos” não é reconhecida na passagem. Todos os que amam a Deus presentemente, foram antevistos em Cristo. Estes serão finalmente glorificados, passando pelo chamado e pela justificação. Não há um único justificado pela fé em Cristo, isto é, salvo, que não seja finalmente glorificado.[5]
* TITILLO, Thiago Velozo. Jamais Perecerão: uma análise teológica, histórica e exegética da segurança eterna dos salvos. Rio de Janeiro: Verbum Publicações, 2017, pp. 68-68.
[1] Deve-se ter em mente que as expressões “eternidade passada” e “eternidade futura” são uma linguagem de acomodação para o homem, visto que este experimenta limitações temporais. A Bíblia usa linguagem temporal ao se referir àquilo que é eterno, pois é a Palavra de Deus em linguagem humana. Todavia, para Deus não faz sentido pensar em passado, presente e futuro, pois Ele é eterno, não está preso ao tempo e, por isso, não experimenta sucessão de momentos no seu ser.
[2] Para uma apresentação mais completa da doutrina da eleição, consultar minha obra: TITILLO, Thiago. Eleição condicional. 1. ed. São Paulo: Reflexão, 2015. Em especial, no primeiro capítulo trato da relação entre “eleição” e “predestinação” e abordo o texto de Romanos 8.29 (pp. 15-24).
[3] GEISLER, 2005, p. 137. É oportuno mencionar que a expressão “chamou” (v. 30) deve ser entendida como o chamado que resulta na salvação, o “chamado eficaz”, e não o “chamado geral”, por meio do qual Deus oferece salvação a todos os que estão ao seu alcance (cf. At 17.30).
[4] Principalmente teólogos das tradições wesleyana e pentecostal (cf. capítulo 2).
[5] Ver notas de rodapé 66 e 126.